segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

O Entrudo de antigamente

Antigamente, na nossa aldeia, o Entrudo (que significa "entrada na Quaresma", ou Carnaval = "adeus à carne"), era vivido de forma muito simples, genuína e divertida, talvez mais do que agora. Não havia tentativas de imitar outros de outras paragens, pois não se via TV, nem se liam jornais, etc.
    
Na manhã desse dia, os homens juntavam-se e iam arranjar os principais caminhos que partiam da aldeia para os campos (da estrada até à eira; desta até ao Vale do Russinho; do Fundo do Lameiro até Bouça Enxuta; da Conecril até Pernadinhas e Vale das Ovelhas; etc.). Com as chuvadas do inverno, os caminhos degradavam-se, abriam regueiras, pelo que era preciso recolocar terra, pedras, desviar águas, etc... Assim ficariam mais transitáveis para o período de primavera/verão, em que seriam mais usados...

Em muitas das famílias, por grande influência da religião (ia entrar-se na Quaresma, período de jejum e abstinência que antecede a Páscoa), nesses dias, entre o Domingo, o chamado "Domingo-Gordo", e a terça-feira, dia do Entrudo, fazia-se o "adeus à carne". Assim, o almoço devia ter por base a carne de porco. Fosse um cozido com couve, toucinho, bucho, etc., ou grão cozido com massa e couve, cabeça, chispe e rabo de porco (uma espécie de rancho, à nossa moda)...

Na parte da tarde desse dia, já não se costumava trabalhar: as pessoas dedicavam-se às brincadeiras/ partidas de Entrudo/Carnaval.

Começo por referir que não havia grandes vestimentas, disfarces ou apetrechos. Era muito frequente as raparigas e os rapazes vestirem-se com roupas velhas e andarem pela aldeia, pregando partidas uns aos outros.
    
Uma das formas de divertimento era "mascarrar" os outros com as mãos, negras de fuligem do forno do pão, após se terem esfregado nas paredes deste. Depois corria-se atrás de uns e outros até lhes "pintar" a cara. (Às vezes quem pagava era a roupa, por isso se devia andar mais mal vestido...) Atirar água e farinha era outra das formas de "abordar" alguém...
    
Apesar de parecer que essas formas de passar o dia poderiam trazer consequências negativas, tal não acontecia. Em vez disso, era fortalecido o espírito de convívio entre toda a aldeia, a alegria reinava e todos se distraiam e divertiam. Às vezes o contacto pessoa a pessoa "ajudava a quebrar algum gelo" e mais as pessoas se aproximavam. Casos houve em que alguns começaram a namorar após essas partidas: "- Aleijaste-me!" "- Desculpa, foi sem querer!"... "Para fazer as pazes, dá cá/toma lá um beijinho..."
    
E assim se passava normalmente toda a tarde do dia de terça-feira. Pois o Entrudo resumia-se unicamente a esse dia, e não aos anteriores. Só mais recentemente se começou a usar o ditado "a vida são dois dias e o Carnaval são três"; por isso divirta-se!

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Descubra portas, janelas e outros detalhes da aldeia (em atualização)

Quem reconhece a porta da sua casa atual (ou daquela onde nasceu)? Com toda a certeza que já foi bem diferente da de hoje!... E os palheiros, janelas, etc.?!

Eis uma variedade de fotos, retratando traços típicos da nossa aldeia. Agradeço as ideias e colaboração do meu primo Jorge Alves e do meu afilhado Tiago Cassapo Dias.

(NB: Com tempo, pretendo adicionar outros detalhes: janelas, portas de currais, palheiros, ferramentas, placas, marcos da estrada, pontão, etc...)



















(Eu vi um gatinho!...)

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(Costela para pássaros grandes e perdizes. Para pássaros pequenos e ratos, são mais pequenas...
Podem ser fixas a uma base de madeira ou cordel.)


(tão docinho...)





(Temos do colocar a moer, um dia...)





Viv´o descanso!...



Estas 3 acima são de material já muito fatigado...







Aguarde mais...

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Os nomes dos locais da aldeia (toponímia)

Segue uma relação (para ir completando, gradualmente) com os nomes atribuídos pelos nossos antepassados aos diversos locais de cultivo: hortas, courelas, olivais, floresta, etc.:

- Açude
- Atalhinhos
- Atalhos
- Azenha
- Bacelo
- Barreirinhas
- Barroca da Corga
- Barroco Fundeiro
- Bouça Enxuta
- Bouça Velha
- Cabeçalta
- Cabeço Alto
- Cabulo
- Cão do Currel (ou Covão do Curral) *
- Cão da Ucha
- Castanheiros
- Cerro da Portelinha
- Cimo da Corga
- Cimo da Corguinha Madeiros
- Cimo do Vale
- Cimo do Valtorno
- Có Ferreiro (ou Corga do Ferreiro) *
- Có Friura
- Có Palerto
- Có Raposas
- Có Salgueiro
- Conecril (ou Corga do Alecrim)
- Corga
- Corga da Fonte
- Corga de Frade
- Corguinha Madeiros
- Corguinha (ou Correguinha) Videira
- Cortimpires (ou Corga Tio Pires)
- Costa do Cão
- Costa Galega
- Covão
- Eira
- Fonte Velha
- Fundo do Lameiro
- Fundo do Povo
- Horta do Meio
- Horta Nova
- Hortas
- Hortelha
- Lameiras
- Lameiro
- Lenteiro (ou Linteiro)
- Moinho (ou Munho)
- Nateiro
- Pernadinhas
- Piçarras (ou Picerras)
- Portela
- Ribeira (de Mesão Frio)
- Tapada(s)
- Tapada Cimeira
- Tapada de Trás
- Tapada Fundeira
- Valdanta (ou Vale d´Anta) *
- Vale da Estrada
- Vale da Figueira
- Vale das Ovelhas
- Vale de Sete
- Vale (do) Russinho
- Vale Indreu
- Vale Travesso
- Valitos
- Valtorno (ou Vale Torno)
- Varja Grande
- Varja Videira
- Varjas

* Nota: Os termos "cão", "có" e "val" são abreviaturas de "covão", "corga" e "vale", respetivamente... "Varja" é o mesmo que "Várzea".

(Obrigado ao Fernando Alves, que me lembrou alguns. Quem conhecer ou se lembrar doutros locais, que mos indique, por favor...)

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

A fogueira de Natal e a ida aos madeiros

Nos dias que antecediam a noite de Natal, os rapazes da aldeia reuniam-se e, pela calada da noite, começavam a juntar os madeiros para a fogueira que iria ser acesa na noite de Natal. (Lembro-me dum ano em que também as raparigas se juntaram aos rapazes, quando fomos na camioneta do falecido primo Domingos Mendes carregar troncos de oliveira, entre o nó do IC8 e a "Fonte de Meio Alqueire" - quem sabe onde é?)...

Madeiros preparados para a fogueira (em Proença, 2010 - foto do Raul Sonso)     

Normalmente, já se tinha "deitado o olho" às azinheiras e/ou oliveiras que seriam "sacrificadas", quer estivessem ou não abandonadas. Tanto podiam estar ainda em crescimento como já cortadas, ou apenas ser um bocado (cepo, tronco, etc.)...

As árvores eram quase sempre pertencentes a alguém que fosse de fora da aldeia. Portanto, era conveniente que ninguém se apercebesse da apropriação das mesmas! Como tal, havia um secretismo máximo tanto na seleção das árvores como no seu abate, transporte e guarda até ao dia em que iriam ser queimadas.

A lenha/toros era transportada numa carroça (se necessário, duas), que os rapazes puxavam e/ou empurravam. Lembro-me de algumas vezes ter de ser levada pelo ar, ou então rodar muito devagar, para não fazer barulho ao passar junto de casas/pessoas doutras aldeias...
    
Além da carroça, muníamo-nos de serras, serrotes (raramente machados, para não fazer muito ruído), cordas e picaretas/enxadões... O pessoal era obrigado a bom esforço físico, tanto para cortar e carregar as árvores, como para fazer rolar a carroça, por diversos tipos de piso... E, no escuro da noite, só tínhamos a ajuda do luar ou de lanternas a pilhas ("foxes").

Havia uma grande rivalidade entre aldeias vizinhas, cada qual tentando surpreender (roubando) aos outros! Até chegávamos a simular ataques aos tiros ou à bomba, pelos cabeços abaixo, para afugentar outros competidores e apoderarmo-nos de certo cepo/árvore que eles pretendiam. Uma vez, um proprietário de um cepo já velho, junto à estrada da Bairrada, resolveu ir passar parte da noite junto do seu cepo, para o guardar. Mas, creio que acabámos por lhe deitar o fogo, ali mesmo no local, um tempo depois do Natal, já que não o conseguimos levar...

Os madeiros eram guardados, escondidos em currais ou palheiros. No dia 24, à tardinha, era preparada a fogueira, com a colocação dos madeiros em pilha, juntamente com ramos e carquejas (ou até palha). À hora fixada, era então acesa, às vezes com a ajuda de óleo queimado, sobretudo se chovesse ou a lenha estivesse molhada. As labaredas e faúlhas iluminavam então o Largo da Fonte (actualmente Largo P.e José Alves Júnior), o local mais central da aldeia e, portanto, de eleição para todo o tipo de convívios e eventos...

Junto da fogueira compareciam, então, quase todas as pessoas da aldeia. Por tradição, era nessa noite que se costumava fazer as filhós (ou "filhoses"). Havia quem trouxesse algumas para se provar, juntamente com algum vinho ou aguardente e, creio, até mel!...

Costumava, às vezes, entoar-se alguns cânticos (de Natal ou outros), ao redor da fogueira. Um, muito usado, tinha a seguinte letra: "Natal, Natal, filhoses com mel não fazem mal; Natal, Natal, filhoses com vinho não fazem mal"... Era uma noite especial de convívio, do mais salutar e genuíno...

Actualmente, as técnicas e tácticas para arranjar madeiros são outras, assim como o tamanho da fogueira!... Mas convém continuar a manter estas tradições...



Fotos da fogueira, no Natal de 2004.